ALGORITMOS SÃO OS VILÕES: SIR TIM BERNERS-LEE CULPA A PROGRAMAÇÃO PELA TOXICIDADE NAS REDES SOCIAIS
É sempre uma experiência inspiradora participar do Web Summit em Lisboa, o maior palco de tecnologia do mundo. E, em 2025, tive o privilégio de estar presente em um dos painéis mais aguardados, que contou com a presença de Sir Tim Berners-Lee. O inventor da World Wide Web trouxe uma perspectiva contundente e inegável sobre a crise de toxicidade que assola as redes sociais.
Em meio a discussões sobre o futuro da tecnologia, o pai da internet não poupou críticas ao defender que a culpa principal pelo ambiente hostil online não é dos usuários, mas sim dos algoritmos projetados para nos prender.
Para Berners-Lee, a solução para um ambiente online mais saudável é surpreendentemente simples, exigindo apenas um pequeno ajuste no código por parte das empresas.

Imagem: Silvia Triboni
O Poder do Clique Tóxico
Para Berners-Lee, culpar o indivíduo que posta uma mensagem agressiva ou polarizadora é desviar o foco do problema real. Ele questiona: “Talvez você deva culpar o fato de que o algoritmo mostrou aquele tuíte para 2 milhões de pessoas.”
A razão pela qual posts chocantes e que dividem opiniões ganham tanta visibilidade não é porque “o mundo é tóxico”, mas sim porque “isso fará você clicar, isso fará você levantar as sobrancelhas”. Para as grandes plataformas, essa reação equivale a capital e engajamento.
Pesquisas recentes corroboram essa visão. Estudos já mostraram que algoritmos amplificam conteúdo extremista e misógino, que rapidamente se infiltra na cultura jovem e nas escolas. Outros indicam que plataformas podem até mesmo inflar artificialmente o alcance de certos conteúdos ou figuras políticas.
A Solução está no Código: “É muito importante que percebamos que essa toxicidade vem dos algoritmos e você pode mudar isso,” afirma Berners-Lee. Ele insiste que “há algum programador que pode simplesmente sentar e ajustar a forma como a IA é treinada para que possa ser mais saudável, construtiva, criativa e útil.”
Web 35 Anos Depois: O Bom e o Ruim
Refletindo sobre as três décadas e meia da web, Berners-Lee afirma que grande parte dela se desenvolveu como ele imaginou: como uma plataforma geral que estimula a criatividade alheia.
“O testemunho de uma boa plataforma é que as pessoas a usem para fazer coisas que elas criaram e que o próprio criador da plataforma jamais poderia igualar,” ele comenta.
No entanto, a polarização induzida pelo design algorítmico o preocupa profundamente, especialmente quando se trata de crianças e adolescentes. Ele reconhece que a web trouxe coisas maravilhosas, especialmente na educação, mas alerta para o perigo do doomscrolling (o ato de ficar rolando feeds de notícias negativos).
A chave para o uso do celular por crianças, segundo Berners-Lee, é o design: “Temos que encontrar maneiras de dar aos seus filhos um telefone que responderá a todas as coisas boas, mas bloqueará todas as coisas que polarizam a sociedade.”
Nova Missão: Proteção de Dados e o Projeto Solid
Recentemente, Berners-Lee encerrou a World Wide Web Foundation, sentindo que parte de sua missão inicial de conectar o mundo foi alcançada. Agora, seu foco mudou para a proteção de dados e a disfunção da web.
Ele lamenta que, em vez de “capacitar a humanidade,” a web tenha, na última década, corrompido esses valores através da centralização de plataformas.
Sua solução é o Projeto Solid e a empresa Inrupt. Solid propõe uma terceira camada de protocolos, dando ao usuário sua própria identificação pessoal e um “Pod” (personal online data store).
Este “Pod” é um cofre de dados privado onde o indivíduo armazena suas informações, mantendo o controle total sobre quem pode acessá-las, invertendo o modelo atual onde as grandes empresas detêm o poder sobre os dados dos usuários.
Em um mundo onde a própria fundação da web está sendo usada para polarizar, a mensagem de Sir Tim Berners-Lee é clara: a tecnologia não é neutra.
Ao responsabilizar os algoritmos e oferecer uma solução técnica como o Solid, ele nos lembra que podemos e devemos redesenhar a internet para que ela cumpra sua promessa original de ser uma ferramenta para o bem da humanidade.
É fundamental que, como usuários, não fiquemos apenas na indignação passiva com a polarização e a toxicidade que consumimos diariamente. A visão de Sir Tim Berners-Lee é mais do que um diagnóstico; é um chamado à ação.
Se a raiz do problema está no código dos algoritmos, a solução reside em exigir e apoiar novas arquiteturas.
A revolução de dados não será imposta pelas gigantes de tecnologia, mas sim impulsionada por nossa reflexão consciente e nossa escolha ativa por plataformas e ecossistemas que priorizem a dignidade humana sobre o lucro algorítmico.
Estamos prontos para tirar nossos dados das grandes corporações e assumir o controle total do seu próprio Pod?

Imagem: Silvia Triboni
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